juízo

(gr. to kritikon, krisis; lat. Judicium; in. Judgment; fr. Jugement; al. Urteilskraft, Urteil; it. Giudizió).

Este termo, oriundo da linguagem jurídica, possui quatro significados principais: 1) faculdade de distinguir e avaliar ou o produto ou o ato desta faculdade, bem como sua expressão; 2) uma parte da lógica; 3) em relação a uma proposição, ato de assentir, discordar, afirmar ou negar; 4) operação intelectual de síntese que se expressa na proposição.

1) No sentido mais geral, entende-se por juízo a faculdade de avaliar e escolher, própria de todos os seres animados. Aristóteles dizia que o juízo é uma das faculdades da alma dos animais (a outra é a faculdade motriz), sendo obra do pensamento e da sensação (De an., III, 9, 432 a 15). Em especial, atribuía ao intelecto a capacidade de julgar as qualidades sensíveis com o sensório e a substância das coisas com um meio diferente (Ibid., III, 4, 429, b 10). O significado geral conservou-se constante na tradição filosófica e na linguagem comum. A faculdade de julgar consiste em avaliar, escolher, decidir. “Ter juízo” significa saber ser comedido nas escolhas, ou fazê-las de acordo com as melhores regras. Nesse sentido, o juízo é qualificado segundo os campos específicos em que age, falando-se de “juízo moral”, “estético”, “histórico”, “político”, etc. Esse termo ainda indica, em todas línguas, o resultado ou o produto da atividade judicativa e a expressão linguística desta: por isso, chama-se de juízo tanto a decisão ou a escolha que elimine uma incerteza, dirima uma controvérsia ou elimine um conflito quanto a formulação verbal de alguns desses atos. Nesse sentido, a faculdade judicativa não se reduz ao intelecto, conquanto compreenda também o intelecto. Tomás de Aquino observava que “a palavra ‘juízo’, que segundo a primeira imposição significa a correta determinação do que é justo, foi ampliada para significar a correta determinação em todas as coisas, tanto nas especulativas quanto nas práticas” (S. Th., II, 11, q. 60 a. 2 ad 1o). Kant, que definia o intelecto como “a faculdade de julgar” (Crít. R. Pura, Anal. transe, I, cap. I, seç. I; Prol, § 22), em Antropologia conceituava de modo mais geral o juízo, entendendo-o como “a capacidade intelectual de distinguir se cabe ou não uma regra”, e afirmava que o juízo não pode ser ensinado, mas só exercitado, e que o seu desenvolvimento chama-se “maturidade” (Antr, 1, § 42). Locke havia restringido o juízo à faculdade de utilizar os conhecimentos prováveis na falta do conhecimento seguro (Jud., IV, 14, 3), mas Leibniz observava que “outros chamam de julgar a ação realizada todas as vezes em que alguém se pronuncia com algum conhecimento de causa” (Nouv. ess, IV, 14).

Nesse sentido, o juízo é uma atividade valorativa, embora possa expressar-se (como de fato o fez com frequência) por fórmulas verbais diversas, como regras, normas, exortações, imperativos, pareceres, conselhos, conclusões e, em geral, fórmulas que expressam uma escolha ou um critério de escolha. Peirce diz: “O hábito cerebral da mais alta espécie, que determinará o que faremos, tanto em imaginação quanto em ação, chama-se crença. Chama-se juízo a representação, que fazemos para nós mesmos, de que temos determinado hábito” (Coll. Pap. 3, 160).

Na mesma linha, Dewey considerou o juízo como a conclusão de uma busca e a sistemati-zação efetiva da situação que a provocou, segundo o modelo do procedimento judiciário (Logic, 1939, cap VII).

2) Cícero deu o nome de “juízo” à dialética dos estoicos, que “foi inventada quase como árbitro e juiz do verdadeiro e do falso” (Acad., II, 28, 91). Disse ele: “Todo tratamento completo da argumentação possui duas partes, uma que se ocupa da invenção a outra do juízo”. Aristóteles foi o fundador de ambas, os estoicos seguiram diligentemente, somente o caminho do juízo (Judicandi vias) na ciência que chamaram dialética mas descuraram a arte da invenção que é a tópica (Top., 2, 6). Boécio aceitou a participação de Cícero (P. L., 64; col. 73 a 1046). Esta doutrina passou em alguns filões da lógica do séc. XVI. Pierce de la Ramée considerava a participação da lógica nas duas partes da invenção e do juízo como baseada em distinção natural dos poderes da razão através da qual, primeiro se pensa algo, após julga-se-o. Mantinha portanto esta participação presente na própria obra de Aristóteles e identifica o juízo com o método (Scholae dialecticae, I, cap. 8; ed., 1594, págs. 54-55, Dialectique, 1555, pág. 4). Jungius fazia referência a esta distinção (Logica Hamburgensis, 1638, Prol. 24).

3) Na lógica terminística medieval por “juízo” ou “ato julgado”, foi entendido ainda aquilo que os Estoicos chamavam assentimento. Ockham por ex., distinguia dois atos do intelecto, como apreensivo (apprehensivus) e judicativo (judicativus). Finalmente “o intelecto não obstante apreende o objeto mas também consente nisso e dissente disso e é um ato que só diz respeito a noções complexas já que não assentimos com o intelecto senão aquilo que cremos verdadeiro nem dissentimos senão aquilo que cremos falso” (In Sent., Prol., q. I o, Quodi, III, q. 8). Neste sentido o ato julgador é a aceitação ou a refutação de uma proposição (ou de uma demonstração) ou em outros termos é a crença. Traços ou repetições desta doutrina podem ser encontrados em autores mais recentes. Na Psychologie vom empirischen Standpunfyt (1874) Franz Brentano dividia a atividade psíquica em duas classes: a da representação que é a manifestação de um objeto e a de juízo que é a aceitação daquilo que é verdadeiro e a refutação do que é falso.

Frege julgava oportuno introduzir o uso do sinal h- para distinguir o juízo como reconhecimento ou não reconhecimento de uma verdade a um mero complexo de ideias (Begriffsschrift, 1879, § 2, trad. ingl. Geach, págs. 1-2). Meinong mantinha que um juízo se distingue de uma pura representação porque contém o momento da convicção e porque esta convicção consiste no adotar a atitude da aceitação ou a da refutação (Über Annahmen, 1902, pág. 2). E sob este aspecto se pode entender a doutrina de Russell que considera a proposição como uma atitude psicológica.

4) A partir da época cartesiana, por juízo se entende, de preferência, um ato ou uma operação mental de síntese que encontra expressão na proposição. Dscartes afirmara que, além dos pensamentos que são quase “imagens das coisas”, existem na alma outros pensamentos que possuem forma diversa. “Quando desejo, temo, afirmo ou nego, dizia ele, concebo também algo como o sujeito da ação do meu espírito mas junto ainda alguma outra coisa a esta ação, a ideia que faço dessa coisa, deste gênero de pensamentos, que são chamadas vontade ou afeições, e por outros juízo’* (Méd., III). A lógica de Port-Royal definia o juízo como a operação que consiste “em unir e desunir a ideia à segunda que convém pelo menos” (Arnauld, Logique, Discours, 1): definição que Locke adota como definição do conhecimento em geral (Jud. IV, I, 2). Para Kant o juízo é “a representação da unidade da consciência de representações distintas; ou presentação das relações entre estas representações enquanto constituem um único conceito” (Logik, § 17). Kant mantém todavia que a unidade entre as representações, estabelecida para juízo, é uma unidade objetiva, isto é, fundada não sobre associação psicológica das representações, mas sobre apercepção que é a função lógica unificadora da consciência em geral, isto é, da consciência comum a todos os seres pensantes. Este é o sentido da definição que se encontra variadamente expressa na Crítica da Razão Pura; por ex., quando se diz: “O juízo.não é outra coisa senão o modo de reconduzir conhecimentos dados a unidade objetiva da apercepção” (Crít. R. Pura, § 19). Deste modo uma operação subjetiva (enquanto pertencente ao sujeito) porém objetiva enquanto universal ou comum é posta por Kant ao fundamento do juízo e de sua validade.

A doutrina de Kant determinou a prevalência da concessão do juízo como ato intelectual de síntese em toda a lógica filosófica do séc. XIX. Esta doutrina vem repetida em quase todos os tratados de lógica, e a monumental Geschichte der Logik im Abend-lande (4 volumes, 1855-70) de K. Prantl adota constantemente neste sentido a palavra juízo, algumas vezes com estranhos efeitos anacrônicos. As especulações lógicas do idealismo de Hegel e dos hegelianos tomam como ponto de partida o conceito kantiano e veem no juízo a atividade que medeia o sujeito (particular) com o predicado (universal), isto é, que distingue e ao mesmo tempo unifica o universal e o particular (Hegel, Wissenschaft der Logilt, III, i, 2; Ene., § 166; Gentile, Sistema di Lógica, I, 1922 2, págs. 192 e segs.). Bradley e Bosanquet consideraram como sujeito autêntico do juízo, ao qual se referem as qualificações ou a ideia que constituem o próprio juízo, a realidade total, isto é, o Absoluto ou Consciência (Bradley, Appearance and Reality, 1902 2, pág. 370; Bosanquet, Logic, I, 1888, pág. 294). De outra parte, os próprios lógicos matemáticos usaram frequentemente a palavra “juízo” porém num sentido diverso, do qual acabou resultando aquele de proposição. Todavia, no mesmo âmbito da lógica filosófica determinou-se a reação contra a noção de juízo como operação mental. Husserl iniciou estabelecendo a distinção entre o ato do juízo e a essênciaintencional” ou “cognoscitiva” que seria o seu conteúdo objetivo (Logische Untersuchungen, 1900, II, V, § 21), e mais tarde do juízo como noesis que é o “julgar”, distinguia o juízo como noema que é o “julgado” isto é o “juízo formulado” que torna possível a consideração lógicoformal do próprio juízo Ambos os aspectos são fornecidos todavia na experiência vivida (Erlebnis) do julgar (Ideen, I, § 94). [Abbagnano]


A ligação entre ideias. — O juízo é a reflexão sobre uma relação entre os conceitos (ou ideias); distingue-se do raciocínio, que se define como uma ligação dos juízos entre si Distingue-se o conhecimento e o juízo, que é a arte de pôr em prática conhecimentos abstratos: uma “cabeça bem cheia”, como desejava Rabelais, pode possuir muitos conhecimentos e não saber “ajuizar” na vida (o que uma “cabeça bem feita” pode fazer, segundo a prescrição de Montaigne). Kant definiu precisamente o juízo como a arte de relacionar (de “subsumir”) um caso particular a um conceito geral, ou, o que é a mesma coisa, de aplicar esse conceito geral a uma “intuiçãoparticular. [Larousse]


“Juízo” é o ato central do conhecimento humano, a elucidação lógica e metafísica do qual compete à teoria do juízo levar a efeito. A consideração lógica investiga o juízo como forma de pensamento, atendendo à sua estrutura essencial e às suas propriedades necessárias. Desse ponto de vista, o juízo distingue-se do simples conceito e do raciocínio. O conceito representa só um conhecimento incoativo, porque se limita a formar conteúdos, sem relacioná-los com o ser nem expressá-los em sua existência por meio do assentimento. O juízo, pelo contrário, leva o conhecimento a se realizar plenamente, porque relaciona os conteúdos com o ser e, por meio do assentimento, constitui uma expressão do ser deles. Diante do juízo, o raciocínio não significa ulterior perfeição da essência interna do conhecimento, mas sim o avançar de um assentimento a outro.

A estrutura exata do juízo pode elucidar-se na proposição ou, com maior rigor, na proposição enunciativa, pois que a função da proposição consiste em ser expressão oral ou sinal manifesto daquele. A proposição atribui um predicado a um sujeito mediante a cópula “é”. Em oposição a um conceito composto (p. ex., homem mortal), a essência da proposição e, por conseguinte, do juízo, reside na cópula, porque ela exprime a relação com o ser e o assentimento (p. ex., o homem é mortal). Para assegurar a verdade da proposição e do juízo, alguns (p. ex., Bolzano) admitem proposições em si (verdades em si) que não existem para além da realidade, mas possuem uma certa existência (cf. os produtos de sentido irreal de Rickert). Esta concepção, que traz à memória as ideias platônicas, não é necessária, porque a verdade do juízo fica plenamente garantida pelo fato de o objeto enunciado existir realmente, ao passo que a forma da enunciação representa somente o modo (fundamentado na realidade dada) como nós, homens, devemos exprimir esta realidade a fim de poder compreendê-la pelo pensamento.

Expliquemos algumas propriedades do juízo e divisões a elas ligadas. A qualidade do juízo é inerente à cópula, enquanto esta, como afirmação no “é” ou negação no “não é”, atribui ou denega respectivamente o predicado ao sujeito. Assim, temos juízos afirmativos e negativos, m, outrossim, inerente à cópula a modalidade do juízo, pela qual este exprime o modo do “é” ou do “não é”. Daí resultam juízos apodícticos, que anunciam algo como absolutamente necessário ou absolutamente impossível, juízos assertórios, que dizem simplesmente “é” ou “não é”, e juízos problemáticos que exprimem um poder-ser ou também a possibilidade do nãoser. Segundo a extensão do sujeito é diversa a quantidade do juízo. Consequentemente, distinguem-se juízos universais, particulares, singulares, e indefinidos; nestes últimos a extensão do sujeito fica indeterminada. No que tange à relação do predicado com o sujeito, o juízo afirmativo “põe” sempre a identidade de ambos, pelo menos a identidade material em virtude da qual o predicado convém de fato ao sujeito, p. ex., Pedro está em casa. Pode, no entanto, existir também uma identidade formal, de maneira que o predicado esteja implicado essencialmente no sujeito; tais juízos chamam-se juízos de identidade, em sentido acentuado. Não coincidem eles, por forma alguma, com os juízos tautológicos, nos quais o predicado repete o que o sujeito já disse, nem são essencialmente analíticos (Análise); antes, podem ser também juízos essenciais sintéticos (p. ex., todo ente contingente exige uma causa (Síntese). Além dos juízos simples, há os juízos compostos. Enquanto os juízos categóricos enunciam de maneira absoluta (Carlos estudará), os juízos proporcionais acrescentam, numa proposição ulterior, uma condição (Carlos estudará, se obtiver uma bolsa). Os juízos disjuntivos mostram uma disjunção (Carlos estudará ou será comerciante); pelo contrário, os juízos conjuntivos negam que dois enunciados possam ser simultaneamente verdadeiros (Carlos não pode estudar e ser comerciante ao mesmo tempo). Os juízos copulativos unem numa só proposição vários sujeitos ou (e) vários predicados (Carlos e Francisco estudam; Carlos ganha a vida e estuda ao mesmo tempo).

A consideração metafísica do juízo situa a forma humana do pensamento, que é o juízo, no contexto total de uma metafísica do conhecimento. Essa consideração deve tomar como ponto de partida o juízo que enuncia a essência de um indivíduo concreto. Nosso conhecimento detém-se primeiramente no aspecto manifesto das coisas; se não fôr mais além, será mero conhecimento sensorial. Na realidade, porém, penetra ele, enquanto conhecimento intelectual, até ao âmago mais íntimo das coisas que aparecem, a saber: até ao ser. Todavia uma coisa finita nunca possui o ser em sua plenitude total, ou seja, segundo todas as suas possibilidades, mas unicamente; na medida de sua essência, a qual representa sempre um modo limitado de ser. A coisa encerra os três graus: indivíduo, essência, ser, numa síntese compacta e opaca. O juízo, depois de separar estes graus pela abstração, reúne-os numa síntese estruturada e diáfana. A síntese existente na coisa retém os dois últimos fatores dentro dos limites do indivíduo; a síntese judicativa eleva os dois primeiros à amplitude do ser. Por esta forma, imita, à sua maneira, a visão divina, inscrita de antemão no Ser absoluto e que, por isso mesmo, compreende tudo, do ponto de vista da razão mais íntima do ser. Esta imitação da visão tem sua expressão na tendência natural da mente para o Ser absoluto, tendência que, segundo Marechal, constitui o único fundamento da verdade objetiva do juízo (VIDE dinamismo) Lotz. [Brugger]


Dos numerosos significados que se têm dado ao termo juízo examinaremos os seguintes: 1) juízo é a afirmação ou a negação de algo (de um predicado) em relação a algo (um sujeito; Esta é propriamente a definição da proposição, mas pode alargar- se também ao juízo como termo mental correlativo da proposição. 2) Juízo é um ato mental por intermédio do qual se une, ou sintetiza, afirmando ou separando, negando; é uma definição frequente em textos escolásticos e neo-escolástico.. 3) Juízo é uma operação do nosso espírito na qual se contem uma proposição que é ou não conforme à verdade e segundo a qual se diz que o juízo é ou não correto. 4) Juízo é um produto mental enunciativo… 5) Juízo é um ato mental por intermédio do qual pensamos um enunciado; pode encontrar-se esta definição em vários lógicos atuais.

É frequente considerar que o juízo se compõe de conceitos e que estes estão dispostos de tal forma que constituem uma mera sucessão. por isso, conceitos como “os homens bons” não são juízos. Em compensação, a série de conceitos “os homens bons são recompensados” é um juízo. Daí que deva haver no juízo afirmação ou negação e que o juízo tenha de ser verdadeiro ou falso. Um imprecação, um rogo, uma exclamação, um interrogação, não são juízos. Por isso os escolásticos dizem que os juízos constituem segundas operações do espírito, sobrepostas às primeiras operações, que são apreensões de conceitos. O que os juízos são enunciados (proposições ou orações enunciativas).

Os juízos compõem-se de três elementos: um é o sujeito, que, como é um conceito, pode qualificar-se de conceitosujeito. O conceitosujeito, se simboliza mediante a letra s, distinguese do termo que desempenha a função de sujeito na oração, assim como do objeto a que se refere. Outro elemento é o predicado, que, como é um conceito, pode qualificar-se de conceito predicado. O conceitopredicado, que se simboliza mediante a letra p, distingue-se do termo que desempenha a função de predicado na oração, assim como do objeto a que se refere. Outro elemento, finalmente, é a cópula, que enlaça o conceitosujeito com o conceitopredicado. A cópula afirma “é” ou nega “não é” o predicado do sujeito. Assim, no juízo “todos os homens são mortais”, “todos os homens” é a expressão que designa o conceitosujeito, “mortais” é a expressão que designa o conceitopredicado e “são” é a cópula que os enlaça.

Há várias classificações possíveis dos juízos. Referir-nos-emos aqui às mais usadas. Do ponto de vista da inclusão ou não inclusão do predicado no sujeito, os juízos dividem-se em analíticos e sintéticos. Do ponto de vista da sua independência ou dependência da experiência, os juízos dividem-se em a priori e a posterior. Junto a estas classificações há uma que ocupa um lugar central na doutrina tradicional do juízo, pelo que nos referiremos a ela mais pormenorizadamente: é a que distingue no juízo a qualidade, a quantidade, a relação e a modalidade.

Segundo a qualidade, os juízos dividem-se em afirmativos e negativos. Exemplo de juízo afirmativo é “João é bom”. Exemplo de juízo negativo é “João não é bom”. De acordo com alguns autores, pode-se falar também do ponto de vista da qualidade de juízos indefinidos. Assim, o admite Kant, quando distingue entre juízos indefinidos e juízos afirmativos. Um exemplo de juízo indefinido é “a alma é não mortal”. Muitos autores rejeitam os juízos indefinidos, pois consideram que do ponto de vista da forma tais juízos são afirmativos. Segundo a quantidade, os juízos dividem-se em universais e p+articulares. Um exemplo de juízo universal é “todos os homens são mortais”.Um exemplo de juízo particular é “alguns homens são mortais”. Alguns autores indicam que há também juízos singulares; um exemplo destes é “João é mortal”. Segundo a relação, os juízos dividem-se em categóricos, hipotéticos e disjuntivos… Exemplo de juízo categórico é “os Suecos são fleumáticos”. Exemplo de juízo hipotético é “se larga uma pedra, cai no chão”. Exemplo de juízo disjuntivo é “Homero escreveu a Odisseia ou não escreveu a Odisseia”. Segundo a modalidade, os juízos dividem-se em assertóricos, problemáticos e apodícticos….. Exemplo de juízo assertórico é “António é um estudante exemplar”. Exemplo de juízo problemático é “os turcos são provavelmente bebedores de café”. Exemplo de juízo apodíctico é “os juízos são necessariamente séries de conceitos formados de três elementos”.

As combinações da qualidade com a quantidade nos juízos dão lugar a quatro tipos de juízo: universais afirmativos (a), universais negativos (e), particulares afirmativos (i) e particulares negativos (o). As relações entre estes tipos de juízos são de quatro categorias: contrária, subcontrária, subalterna e contraditória.

Até agora limitamo-nos a considerar o juízo do ponto de vista lógico, mas e necessário destacar as suas implicações metafísica…. Segundo a concepção tradicional, no juízo afirmamos, pomos ou propomos, a existência, de tal modo que o juízo é propriamente juízo de existência. Portanto, o juízo distingue-se da abstração, pois enquanto esta apreende a essência ou natureza das coisas, o juízo apreende as próprias coisas, isto é, o seu existir. A expressãofaculdade do juízo” – às vezes traduzida simplesmente por juízo – é empregada sobretudo em relação com a filosofia de Kant.. Segundo este autor, a faculdade do juízo designa a faculdade de pensar o particular como submerso no geral. Se o geral está dado, a faculdade do juízo que submerge nele o particular chama-se juízo determinante ou determinativo; se está dado o especial e é preciso submergir no geral, a faculdade que procura o geral no qual submergir o especial chama-se juízo reflexivo.

O juízo reflexivo é o tema central da Crítica do Juízo, que propõe adequar ou subordinar ou submergir algo num fim. A questão fundamental de tal crítica – “é possível julgar que a natureza está adequada a um fim?” – representa a mais alta síntese da filosofia crítica, a aplicação da categoria da razão prática à razão teórica. [Ferrater]