No que diz respeito ao javali em particular, é sobretudo o aspecto de “simbolismo polar” que importa, o que resulta aliás do fato de que o javali representava antigamente a constelação que, mais tarde, tornou-se conhecida por Ursa Maior. Pode-se ver, nessa substituição de nomes, um dos sinais daquilo que os celtas simbolizavam pela luta do javali e do urso, ou seja, a revolta dos representantes do poder temporal contra a supremacia da autoridade espiritual, com as diferentes vicissitudes que dela resultaram no correr das épocas históricas sucessivas. As primeiras manifestações dessa revolta, de fato remontam muito além da história comumente conhecida, sendo mesmo anteriores ao início do Kali-Yuga, no qual deveria alcançar sua maior extensão. É por isso que o nome bor foi transferido do javali para o urso, e a própria “Bórea”, a “terra do javali”, pôde como consequência tornar-se, em certo momento, a “terra do urso”, durante um período de predominância dos chátrias.ao qual, segundo a tradição hindu, Parashu-Rama colocou um fim. (Guénon)
Entre os gregos, a revolta dos chátrias foi figurada pela caça ao javali de Cálidon, que representa, aliás de modo explícito, uma versão na qual os próprios chátrias exprimem sua pretensão de uma vitória definitiva, visto que o javali é morto por eles. Conta Ateneu, segundo autores mais antigos, que o javali de Cálidon era branco, o que o identifica ao Shwêta-varâha da tradição hindu. E, o que também é muito significativo do nosso ponto de vista, o primeiro golpe foi infligido por Atalanta, que como se diz, foi amamentada por uma ursa. (Guénon)
Convém acrescentar que os símbolos do javali e do urso nem sempre aparecem em oposição ou luta, e que, em certos casos, podem também representar a autoridade espiritual e o poder temporal, ou as castas dos druidas e dos cavaleiros, em suas relações normais e harmoniosas, como se vê em especial na lenda de Merlim e do Rei Arthur. (Guénon)