paradigma

(gr. paradeigma; in. Paradigm; fr. Paradigme; al. Paradigma; it. Paradigma).

Modelo ou exemplo. Platão empregou essa palavra no primeiro sentido (cf. Tim., 29 b, 48 e, etc), ao considerar como P. o mundo dos seres eternos, do qual o mundo sensível é imagem. Aristóteles utiliza esse termo no segundo significado (An. pr, II, 24, 68 b 38). [Abbagnano]


(do gr. paradeigma, modelo exemplo).

Platão chamava as formas (ou ideias) do mundoverdade como paradigmas do mundo fenomenal. É a causa formal para Aristóteles. Vide causa. [MFSDIC]


O conservadorismo de todas as formas de pensamento racional, teológico, eclesial e político teme sempre o novum, como alfobre indominável de incômodos negadores, hereges, revolucionários ou insurrectos. Quando ameaçado, o sistema segrega a «rabies» científica, filosófica e teológica e o poder reage repressivamente de modo exemplar através da polimorfia punitiva do ódio político ou da história sangrenta de hereges, de proveniência católica e até protestante. Este permanente obstáculo ao novo e ao diferente, a outro paradigma ou modelo, atingiu o seu paroxismo niilista na experiência infernal do outro, vivida na cegueira absoluta da diferença.

Pelo que respeita o domínio científico, a consciência do papel desempenhado pelo tipo de diferença, que é na ciência o paradigma, inaugura uma nova fase nas discussões epistemológicas contemporâneas, para além do Positivismo Lógico e do Racionalismo Crítico, com real importância para as ciências humanas, a filosofia e a teologia, pois de modo novo se articulam as tradicionalmente separadas Ciências da Natureza e Ciências do Espírito. É impossível qualquer ciência sem dimensão hermenêutica ou horizonte de compreensão, pois nem nas Ciências da Natureza, como revelam os respectivos paradigmas, se pode eliminar o sujeito humano a favor do mito da pretensa objectividade absoluta. Os conhecimentos das Ciências da Natureza não valem por si mas apenas sob determinadas condições e perspectivas, como ensina hoje a Física após as «revoluções» da Teoria da Relatividade e da Mecânica Quântica. A reposição da história e do sujeito na raiz de todos os paradigmas científicos mostra a insuficiência quer do modelo de verificação do Neopositivismo Lógico quer do de falsificação da Lógica da Investigação de K. Popper. Por esta vertente essencial, o paradigma valoriza as diferenças originais e inauditas, que nutrem o novo na história da intersubjetividade do homem, religando, a partir da vida no mundo, a história, a sociologia e a teoria da ciência. Não é por verificação nem por mera falsificação que se originam novas hipóteses e teorias mesmo nas Ciências da Natureza mas pela substituição de um modelo explicativo até então vigente por um novo, segundo uma mudança não racionalmente prevista mas nem por isso irracional, mais revolucionária do que evolucionária, estudada pelo físico e historiador da ciência citado Th. Kuhn, que, em pouco tempo, se tornou um clássico da Epistemologia Contemporânea. Já no séc. XVIII Georg Christoph Lichtenberg, professor de Filosofia da Natureza em Goettingen, introduziu a expressão «paradigma» para designar determinado padrão fundamental de explicação e influiu profundamente em Ernst Mach e L. Wittgenstein, que se serviram da expressão no sentido de modelo filosófico orientador do pensamento por sendas já dadas e algumas vezes desajustadas. Deste modo, o termo entrou na discussão filosófica, sendo de modo especial analisado pelos discípulos de L. Wittgenstein e recebido no início dos anos cinquenta nos Estados Unidos da América, onde, por influência de J. Conant, senador honorário de Tuebingen e, mais tarde, Presidente da Universidade de Harvard, Th. Kuhn o consagrou definitivamente nos seus escritos. Enquanto modelo de interpretação, de explicação ou de compreensão, paradigma pode ser definido com Th. Kuhn como «uma constelação total de convicções, valores, técnicas, etc., que são partilhadas pelos membros de uma dada comunidade». Aqui, a intersubjetividade é sempre histórica, pois na ciência e na filosofia é extremamente nocivo à compreensão histórica e à crítica racional o uso exclusivo das estruturas formais da sistemática lógica, que, longe de esgotarem a essência da razão, lhe velam a cristalização do saber ultrapassado e impedem a sua abertura a situações novas. Abertos para a vida histórica e social, os paradigmas mudam não apenas na sua configuração teórica mas também no sentido de convicções, valores, técnicas, etc., partilhados pelos membros de uma comunidade. Portanto, a compreensão só se realiza mediante a inclusão de paradigmas interpretativos e, por isso, é necessário inserir na Hermenêutica Clássica os novos modelos saídos, v.g., da discussão da problemática das relações entre teoria e praxis de J. Habermas e Karl-Otto Apel ou de Th. Kuhn e S. Toulmin. Há graduações do paradigma científico, filosófico e teológico, desde a altura envolvente do macromodelo, ao mesomodelo para problemas intermédios e ao micromodelo para as questões de pormenor. [Miguel Baptista Pereira]