nacionalismo

(in. Nationalism; fr. Nationalisme; al. Nationalismus; it. Nazionalismó).

O conceito de nação começou a formar-se a partir do conceito de povo, que havia dominado a filosofia política do séc. XVIII, quando se acentuou, nesse conceito, a importância dos fatores naturais e tradicionais em detrimento dos voluntários. O povo é constituído essencialmente pela vontade comum, que é a base do pacto originário; a nação é constituída essencialmente por vínculos independentes da vontade dos indivíduos: raça, religião, língua e todos os outros elementos que podem ser compreendidos sob o nome de “tradição”. Diferentemente do “povo”, que não existe senão em virtude da vontade deliberada de seus membros e como efeito dessa vontade, a nação nada tem a ver com a vontade dos indivíduos: é um destino que paira sobre os indivíduos, ao qual estes não podem subtrair-se sem traição. Nesses termos, a nação só começou a ser concebida claramente no início do séc. XIX; o nascimento desse conceito coincide com o nascimento da nos gênios nacionais e nos destinos de uma nação particular, que se chama nacionalismo.

O conceito de povo permanecia ligado aos ideais cosmopolitas do séc. XVIII. Mas já em Rousseau se encontra a condenação desses ideais: o apego de Rousseau ao conceito de cidadeestado, da forma realizada na Grécia antiga, levava-o a condenar o universalismo setecentista. Ao mesmo tempo, esse apego anacrônico levava-o a exaltar o valor do Estado nacional: “São as instituições nacionais que formam o gênio, o caráter, os gostos e os costumes de um povo, que o fazem ser ele mesmo e não outro, que lhe inspiram o amor ardente pela pátria, fundamentado em hábitos impossíveis de erradicar, que o fazem morrer de tédio entre outros povos, em meio a delícias das quais está privado em seu país” (Considér sur le gouvernement de Pologne, III). Mas foi principalmente na época da restauração pós-napoleônica que o conceito de nação começou a assumir importância dominante como um dos produtos ou o produto fundamental da “tradição” à qual se atribuía naquele período a origem e a conservação de todos os valores fundamentais do homem. Em Discursos à nação alemã (1808) de Fichte, primeiro documento do nacionalismo alemão, o povo alemão é visto como “o único povo que tem direito de ser chamado de povo, sem outra designação, ao contrário dos ramos que dele se separaram, como, aliás, indica por si só a palavra alemão” (Reden, VII), sendo assegurada pela própria providência da história o futuro desse povo superior. Com a noção de “espírito de povo”, Hegel levava a cabo a elaboração do conceito de nação: “O espírito de um povo é um todo concreto: deve ser reconhecido em sua determinação. (…) Desenvolve-se em todas as ações e em todas as tendências de um povo e realiza-se até a fruição e a compreensão de si mesmo. Suas manifestações são religião, ciência, arte, destinos, acontecimentos. É tudo isso que confere caráter a um povo, e não o modo como ele é determinado por natureza (como poderia sugerir o fato de a palavra natio ter derivado de nasci)” (Phil. der Geschichte, ed. Lasson, p. 42; trad. it., 1, p. 49). No espírito dos povos encarna-se, alternadamente, o Espírito do Mundo, a Razão Universal que preside aos destinos do mundo e determina a vitória do povo que seja sua melhor encarnação. Nesse conceito de espírito do povo como encarnação ou manifestação de Deus no mundo, portanto do caráter fatal e providencial da vida histórica da nação, já estão compreendidos todos os elementos do nacionalismo europeu do séc. XIX e de qualquer nacionalismo.

Na Itália, Mazzini procurou conciliar os ideais universalistas do iluminismo com o nacionalismo, e viu na “missão” de uma nação o modo como esta pode servir ao objetivo geral da humanidade. Era uma síntese bastante incoerente, mas que evitava a exaltação da força que depois seria encontrada com tanta frequência no nacionalismo europeu. Gian Domenico Romagnosi foi o primeiro a apresentar uma teoria jurídica do estado nacional nesse sentido (Delia costituzione di una monarchia nazionale rappresentativa, 1815): teoria adotada mais tarde por P. S. Mancini como fundamento do direito internacional (Delia nazione como fondamento dei diritto delle genti, 1851). Na França a afirmação do nacionalismo está ligada principalmente à obra do historiador Michelet, que, com o livro Le peuple (1843), criava um dos principais documentos do nacionalismo profetizante. Na Alemanha, outro historiador, Treitschke, empreendia a ilustração e a defesa do nacionalismo alemão, que, na origem, vinculou-se à política de força de Bismarck e mais tarde à de Guilherme II. Na Rússia, por fim, Dostoievski erigiu-se em profeta do nacionalismo russo (cf. Hans Kohn, Prophets and Peoples, 1946, trad. it., 1949; The Ideal of Nationalism, Nova York 1944). Tanto a Primeira como a Segunda Guerra Mundial foram travadas sob o emblema de um nacionalismo que perdera todo o contato com o universalismo setecentista e via na força o único sinal decisivo concedido pela Providência histórica à nação por ela favorecida. Essa ideia, entronizada pelo fascismo italiano e pelo nacional-socialismo germânico, não era nova: tratava-se da velha ideia hegeliana e romântica do privilégio que o Espírito do Mundo concede à nação em que prefere encarnar-se, pois o único sinal desse privilégio é precisamente a força vitoriosa que tal nação pode exercer sobre as outras. Esse nacionalismo profético já não é professado hoje em dia pelos povos europeus, que, graças à lição dada pelas duas guerras, foram reconduzidos aos ideais universalistas do iluminismo: tende, porém, a afirmar-se em outras regiões do globo terrestre, às quais só se pode desejar que aproveitem a experiência cultural e histórica da velha Europa. [Abbagnano]