Para conseguirmos, através do seminário, uma visão global da metafísica hegeliana, escolhemos como expediente uma discussão do trecho com o qual começa o primeiro livro da Ciência da Lógica, “A Doutrina do Ser”. Já o título do trecho dá, em cada palavra, bastante que pensar. Ele diz: Com que se deve começar a ciência? A resposta de Hegel consiste na. justificação de que o começo é de “natureza especulativa”. Isto quer dizer: o começo não é nem imediato nem algo mediado. Procuramos dizer a natureza deste começo com um princípio especulativo: “o começo é o resultado”. Isto tem significação múltipla, conforme a múltipla significação dialética do “é”. Uma vez isto: o começo é – tomado o resultare literalmente – o rebate que emerge da plenificação do movimento dialético do pensamento que se pensa a si mesmo. A plenificação deste movimento, a ideia absoluta, é o todo fechado e desenvolvido, a plenitude do ser. O rebate que emerge desta plenitude produz a vacuidade do ser. Com ela deve-se começar na ciência (com o saber absoluto que se sabe a si mesmo). Começo e fim do movimento, e antes disto o movimento mesmo, permanece, em toda parte, o ser. O ser é (west) enquanto movimento que circula em sisi mesmo, indo da plenitude para a mais exterior exteriorização e desta para a plenitude que se plenifica. O objeto do pensamento para Hegel é assim o pensamento que se pensa ã si mesmo enquanto ser que circula em si. Invertido, não apenas com razão, mas por necessidade, o princípio especulativo sobre o começo se formula: “O resultado é o começo”. Com o resultado, na medida em que dele resulta o começo, se deve propriamente começar.
Isto significa o mesmo que a observação que Hegel insere perto do fim de uma passagem e, entre parênteses, no trecho sobre o começo (Lasson, I, 63): “e o mais indiscutível direito teria Deus de que se começasse com ele”. De acordo com a pergunta que vem no título do trecho, trata-se do “começo da ciência”. Se ela deve começar com Deus, ela é a ciência do Deus: Teologia. Este nome fala aqui no sentido que tomou séculos após os gregos. Assim, Teologia é compreendida com a enunciação do pensamento especulativo sobre Deus. Theólogos, theologia, significa na Antiguidade o dizer mítico-poético dos deuses, sem referência a um ensinamento de fé e a uma doutrina eclesial. (MHeidegger 190)