Verenden, verenden
Mais adiante, quando da caracterização da passagem da presença (Dasein) para o não mais ser presença (Dasein), enquanto não-mais-ser-no-mundo, mostrar-se-á que, quando a presença (Dasein) sai do mundo, no sentido de morrer, isso não pode ser confundido com o sair-do-mundo na acepção de simplesmente viver. Apreendemos terminologicamente o findar do ser vivo como FINAR. A diferença só pode tornar-se visível mediante uma delimitação do findar, dotado do caráter de presença (Dasein), frente ao fim de uma vida. Na verdade, também se pode compreender o morrer de modo físico-biológico. O conceito médico de “exitus” não se identifica com o conceito de FINAR. STMSC: §47
Essa pesquisa ôntico-biológica da morte tem por base uma problemática ontológica. Permanece em questão como a essência da morte se determina a partir da essência ontológica da vida. De certo modo, a investigação ôntica da morte sempre já se decidiu sobre essa questão. Nela atuam conceitos sobre a vida e a morte, mais ou menos esclarecidos. Estes necessitam de um prelineamento através da ontologia da presença (Dasein). No âmbito da ontologia da presença (Dasein), que ordena previamente uma ontologia da vida, a análise existencial da morte subordina-se a uma caracterização da constituição fundamental da presença (Dasein). Chamamos de FINAR o findar do ser vivo. A presença (Dasein) também “possui” uma morte fisiológica, própria da vida. Embora esta não possa ser isolada onticamente, determinando-se pelo seu modo originário de ser, a presença (Dasein) também pode findar sem propriamente morrer e, por outro lado, enquanto presença (Dasein), não pode simplesmente FINAR. Chamamos esse fenômeno intermediário de deixar de viver. Morrer, por sua vez, exprime o modo de ser em que a presença (Dasein) é para a sua morte. Assim, pode-se dizer: a presença (Dasein) nunca fina. A presença (Dasein) só pode deixar de viver na medida em que morre. A investigação médico-biológica do deixar de viver logra resultados que, do ponto de vista ontológico, podem também ser relevantes, desde que se tenha assegurado a orientação fundamental para uma interpretação existencial da morte. Ou será que, do ponto de vista médico, até a doença e a morte devem ser concebidas primariamente como fenômenos existenciais? STMSC: §49
Não é, porém, de forma ocasional ou suplementar que a presença (Dasein) realiza para si essa possibilidade mais própria, irremissível e insuperável, no curso de seu ser. Em existindo, a presença (Dasein) já está lançada nessa possibilidade. De início e na maior parte das vezes, a presença (Dasein) não possui nenhum saber explícito ou mesmo teórico de que ela se ache entregue à sua morte e que a morte pertença ao ser-no-mundo. É na disposição da angústia que o estar-lançado na morte se desvela para a presença (Dasein) de modo mais originário e penetrante. A angústia com a morte é angústia “com” o poder-ser mais próprio, irremissível e insuperável. O próprio ser-no-mundo é aquilo com que ela se angustia. O porquê dessa angústia é o puro e simples poder-ser da presença (Dasein). Não se deve confundir a angústia com a morte e o medo de deixar de viver. Enquanto disposição fundamental da presença (Dasein), a angústia não é um humor “fraco”, arbitrário e casual de um indivíduo singular e sim a abertura de que, como ser-lançado, a presença (Dasein) existe para seu fim. Assim, esclarece-se o conceito existencial da morte como ser-lançado para o poder-ser mais próprio, irremissível e insuperável. Com isso, ganha nitidez a delimitação frente a um mero desaparecer, a um mero FINAR ou ainda a uma “vivência” do deixar de viver. STMSC: §50