caminho

P — O senhor deve ter observado que, em minhas publicações posteriores, não emprego mais as palavras “hermenêutica” e “hermenêutico”.

J — Diz-se que o senhor mudou de posição.

P — Deixei uma posição anterior, não por trocá-la por outra, mas porque a posição de antes era apenas um passo numa caminhada. No pensamento, o que permanece é o caminho. E os caminhos do pensamento guardam consigo o mistério de podermos caminhá-los para frente e para trás, trazem até o mistério de o caminho para trás nos levar para frente.

J — Evidentemente o senhor não entende o “para frente” no sentido de um progresso mas… mas… tenho dificuldade de encontrar a palavra certa.

P — “para” — na direção da vizinhança que, apressados, sempre passamos por cima, mas que, cada vez que a vemos, sempre nos traz estranheza.

J — E por isso mesmo logo a perdemos de vista para nos ater ao corrente, útil e proveitoso.

P — Em contrapartida, a vizinhança, sempre desviada pela pressa, nos quer levar de volta.

J — De volta, mas para onde?

P — Para o originário.

J — Para mim, isso é de difícil compreensão, sobretudo quando procuro pensar com base no que o senhor tem escrito até agora. (GA12)


Só depois de haver procurado percorrer por si mesmo o caminho indicado ou, o que seria melhor ainda, depois de haver procurado abrir um caminho melhor, isto é, mais correspondente à questão, cada um julgue se o domínio da Verdade do Ser é um beco sem saída ou o espaço livre, onde a liberdade reserva a sua Essência. Na penúltima página de Ser e Tempo (p. 437) encontram-se as frases : “A disputa relativa à interpretação do Ser (e isso não significa nem do ente, nem também do ser do homem) não pode ser dirimida, porque ainda não foi nem mesmo desenvolvida. E, por fim, ela não se deixa improvisar (vom Zaun brechen) e sim necessita de uma preparação prévia. Só para isso, está a caminho a presente investigação”. Essas palavras valem ainda hoje, dois decênios depois. Continuemos, também nos dias vindouros, viandantes a caminho da vizinhança do Ser. A pergunta, que o Senhor levanta, ajuda a iluminar o caminho. (CartaH)


Ananda K. Coomaraswamy chamou a atenção para o fato de que, tanto no budismo, quanto no bramanismo, o “Caminho do Peregrino”, representado como uma “viagem”, pode ser relacionado ao rio simbólico da vida e da morte de três formas diferentes: a viagem pode ser cumprida, quer remontando a corrente em direção à nascente (v. remontar a corrente), quer atravessando as águas na direção da outra margem (v. travessia), quer enfim descendo a corrente para o mar (v. descer a corrente). Como observa com muita razão, o uso de diferentes simbolismos, contrários apenas na aparência e que têm na realidade a mesma significação espiritual, concorda com a própria natureza da metafísica, que jamais é “sistemática”, mas que, no entanto, apresenta sempre perfeita coerência. É preciso apenas ter em vista o sentido preciso no qual o símbolo do “rio”, com sua fonte, suas margens e sua desembocadura, deve ser entendido em cada caso. (Guénon)