FREUD (Sigmund), neurologista e psiquiatra austríaco, criador da psicanálise (Freiberg, [hoje Pribor], Morávia, 1856 — Londres 1939). Foi influenciado na França (1885) por Charcot, cuja ideia fundamental era que as neuroses, particularmente a histeria, são doenças psíquicas sem lesão orgânica. Trabalhando em Viena com Breuer, de 1895 a 1897, pôde constatar a cura de uma histérica pela pesquisa de seu passado mental por meio do sono hipnótico e pela retomada de consciência do que havia causado, originariamente, o choque emocional; esse choque era um acontecimento de sua vida sexual. Desde então, afirmou a base de sua doutrina, o “freudismo”, que explica quase todas as perturbações psíquicas partindo da libido (ou “tendência sexual”) primitiva, e os princípios de seu método, a “psicanálise”, que pensa suprimir todas as perturbações pela simples análise do inconsciente: a tomada de consciência aparece como uma libertação e uma volta ao estado normal. Segundo Freud, a personalidade do indivíduo é determinada pelas relações da criança com a mãe, do seu nascimento até três anos de idade. Entretanto, as perturbações que a psicanálise pode curar são, em geral, ligadas à sexualidade da adolescência. As obras de Freud são muito concretas e accessíveis a todos. Deve-se começar pela Introdução à psicanálise (1916), passando-se depois à obra Cinco psicanálises. Recomendamos, além disso, A ciência do sonho (1900) e Totem e tabu (1913). (V. infância, psicanálise.) [LArousse]
Freud acreditou poder descobrir a «origem» das religiões no complexo de Édipo nascido de um parricídio primordial, parricídio ritualmente repetido nos «sacrifícios totêmicos». Ele elaborou a sua teoria – que parece manter ainda a aprovação dos psicanalistas – em 1911-1912, utilizando a hipótese da «tribo primordial» de Atkinson e a do «sacrifício-comunhão totêmico» de Robertson-Smith. No momento em que Freud elaborava a sua explicação do sentimento religioso e pensava ter encontrado a «origem» das religiões, as duas hipóteses citadas não gozavam já de crédito algum junto de etnólogos e historiadores de religiões competentes. Se bem que Freud tenha lido Frazer e conhecesse as conclusões a que este último chegara, a saber: a não-universalidade do totemismo como fenômeno sócio-religioso (ele é desconhecido de inúmeras tribos «primitivas») e a extrema raridade dos «sacrifícios-comunhões totêmicos» (quatro casos apenas – e ainda assim desigualmente verificados – para várias centenas de tribos totêmicas!), Totem und Tabu apareceu todavia sob a forma de livro em 1913 e foi depois reeditado continuamente e traduzido em muitas línguas… (poder-se-ia invocar, para a defesa de Freud, o aparecimento em 1912 do famoso livro de Emile Durkheim, Les Formes Élémentaires de la vie religieuse, livro precioso sob muitos aspetos, por vezes quase genial, mas deploravelmente destituído de fundamento. Consideravelmente mais bem informado do que Freud, Durkheim caía no mesmo erro de método, esforçando-se por encontrar no totemismo a «origem» das religiões. Este eminente mestre teria ganho em considerar os trabalhos dos seus colegas etnólogos e antropólogos que já tinham provado suficientemente que o totemismo não representa a mais antiga camada das religiões australianas e, melhor ainda, que ele está ausente de grande número de culturas arcaicas dispersas pelo mundo). (Eliade)
Em Freud, encontrava-se a psicanálise ainda limitada até certo ponto pela atitude materialista que ele sempre pretendeu manter. Mas nem por isso a psicanálise deixava já de possuir um nítido caráter “satânico”, embora isso a impedisse de pretender abordar certos domínios ou, mesmo que tenha pretendido, ela só atingia contrafações muito grosseiras, o que tornava relativamente fácil dissipar as confusões que provocava. Assim, quando Freud falava do “simbolismo”, estava, na realidade, apenas designando abusivamente um simples produto da imaginação humana, variável de um indivíduo para outro, e que não tem na verdade nada em comum com o autêntico simbolismo tradicional. Essa, porém, foi a primeira etapa, e estava reservado a outros psicanalistas modificar as teorias de seu “mestre” em direção a uma falsa espiritualidade, a fim de poder, através de uma confusão muito mais sutil, aplicá-las à interpretação do próprio simbolismo tradicional. (Guénon)