essência da vida

Será preciso lembrar que os famosos versos de Angelus Silesius – “A rosa é sem porquê / floresce porque floresce / não tem preocupação consigo mesma nem deseja ser vista” — procedem diretamente das intuições fulgurantes de Mestre Eckhart, não sendo a rosa senão o nome da vida? Que essa visão inigualada da essência da vida não proceda somente do gênio da imaginação poética, que ela repouse sobre uma análise fenomenológica rigorosa: eis o que aparece aqui com uma clareza intensa. Como a vida afasta tudo que estaria além dela mesma e para o que e em que vivería, seguem-se dois traços decisivos, imediatamente atribuídos à vida por Silesius. O primeiro: é por sua imanência que a vida deve ser a vida e fazer tudo o que faz: “floresce porque floresce”. O segundo: nessa condição originária que é a sua, ela não se reporta ek-staticamente a si de modo algum. Nem na preocupaçãocomo se pudesse pertencer à ipseidade imanente da vida estar “em preocupação consigo” e, assim, separada de si em sua Preocupação sem se destruir a si mesma imediatamente: “não tem preocupação consigo mesma”. Nem num vercomo se a vida pudesse ver-se a si mesma reportando-se intencionalmente a si mesma nesse ver sem se dissolver imediatamente na irrealidade, como Eurídice sob o olhar de Orfeu: “nem deseja ser vista”. (Michel Henry, MHE)