crença mãe

Urglaube

Aquém do juízo de existência e de predicação existe a , o modo da crença «certa». Toda a modalidade da certeza, e também da dúvida, da suputação, da conjectura, remete para uma última e matricial. Husserl é o filósofo que formulou este pensamento na sua generalidade mais radical. «Introduzimos o termo crença-mãe (Urglaube) ou proto-doxa (Urdoxa): ele permite assinalar de um modo adequado a referência intencional […] de todas as ‘modalidades da crença’ à crença-mãe» [Husserl, Ideen, I, trad. fr. (Idées directrices pour une phénoménologie), Gallimard, Paris, 1950, § 105]. Situada antes do juízo, a crença-mãe não se deixa enunciar. O seu conteúdo, como sabemos, consiste na posição pré-reflexiva, antepredicativa, do mundo. A primordial é a perceptiva, modo e modelo originários da «evidência incontestável» [Expérience et Jugement, § 7, trad. fr., P. U. F., Paris, 1970.], uma evidência que é o fundamento último do conhecimento: «Podemos dizer […] que toda a actividade de conhecimento tem sempre por solo universal um mundo; e isso designa em primeiro lugar um solo de crença passiva universal no ser, que é pressuposto por toda a operação singular de conhecimento» (ibid.).

Este solo, que ecoa em todo o juízo, é um nec plus ultra: «Atingimos aqui a fonte mais profunda na qual se pode colher um esclarecimento sobre a universalidade da ordem lógica e finalmente sobre a do juízo predicativo» [Ideen, I, § 117.]. Veremos que esta tese vale tanto para a atribuição negativa como para a afirmativa. [Fernando Gil, MODOS DA EVIDÊNCIA. Lisboa: INCM, 1998, p. 4]