Esta noção é estudada tradicionalmente sob a forma de um princípio: o chamado princípio de contradição (e que, mais propriamente, deveria qualificar-se de princípio de não contradição). Muitas vezes esse princípio é considerado como um princípio ontológico, e enuncia-se então do seguinte modo: “é impossível que uma coisa seja e não seja ao mesmo tempo e sob o mesmo aspecto? outras vezes, é considerado como um princípio lógico (num sentido amplo deste termo), e enuncia-se então do seguinte modo:”não ao mesmo tempo p e não p”, donde p é símbolo de um enunciado declarativo.
Alguns autores sugeriram que há também um sentido psicológico do princípio, o qual se enunciaria assim: “não é possível pensar ao mesmo tempo p e não p” (se o conteúdo do pensar for lógico). ou assim: “não é possível pensar que uma coisa seja e não seja ao mesmo tempo e sob o mesmo aspecto”(se o conteúdo do pensar for ontológico). Nós consideramos que deve eliminar-se o sentido psicológico; a impossibilidade de pensar algo é um fato e não um princípio. Teria mais justificação considerar o princípio do ponto de vista epistemológico, enquanto lei mental, subjectiva ou transcendental que confirmasse todos os nossos juízos sobre a experiência, mas pensamos que isso equivaleria a introduzir supostos que não são necessários numa análise primária no significado e no sentido fundamental do princípio. Notamos que a expressão “ao mesmo tempo e sob o mesmo aspecto”, mencionada quando nos referimos ao sentido ontológico do termo, é absolutamente necessária para que o princípio seja válido; se ausência de semelhante restrição abre o flanco a objecções fáceis contra o mesmo.
As discussões em torno do princípio de contradição diferiram consoante se tenha acentuado o aspecto ontológico (e principalmente metafísico) e o aspecto lógico e metalógico.
Quando predominou o lado ontológico, procurou-se sobretudo afirmar o princípio como expressão de uma estrutura constitutiva do real, ou então negá-lo por se supor que a própria realidade e é contraditória ou que, no processo dialéctico da sua evolução, a realidade supera, transcende ou “vai mais além” do princípio de contradição. Típica a este respeito é a posição de Hegel ao fazer da contradição uma das bases do movimento interno da realidade, mesmo quando deve ter-se em conta que, na maior parte dos casos, os exemplos dados pelo filósofo não se referem a realidades contraditórias, mas contrárias. Quando predominou o lado lógico e metalógico, em contrapartida, procurou-se sobretudo saber se o princípio deve ser considerado como um axioma evidente por si mesmo ou então como uma convenção da nossa linguagem que nos permite falar acerca da realidade.
Apoiando-se, por um lado, em Hegel e, por outro, no exame da realidade social e histórica, (e na ação a desenvolver nessa realidade), Marx propôs uma dialéctica na qual o princípio ou lei de contradição ficava desbancado. Mais sistematicamente, Engels formulou duas das três “grandes leis dialécticas”. “a lei da negação da negação” e a “lei da coincidência dos opostos”. [Ferrater]
O princípio de contradição, ou, mais exatamente, o princípio de não-contradição, é considerado com razão pela escolástica clássica como o princípio primeiro (princípios do conhecimento), ou seja, como o princípio universal, cuja inteleção se reveste de importância básica em todas as operações mentais. Menos afortunadamente, pretenderam alguns filósofos modernos colocar em primeiro lugar, em vez do princípio de contradição, o chamado princípio de identidade Se este princípio não é mera tautologia (“o que é, é”; A = A) ou uma outra forma do princípio de contradição, seu sentido fica indeterminado e nem todos o explicam da mesma maneira. Aristóteles assim formulou o princípio de contradição: “E impossível que o mesmo (o mesmo determinante) convenha e não convenha ao mesmo ente ao mesmo tempo e sob o mesmo aspecto” (Metafísica, 4, 3; 1005 b 19 s.). Este princípio baseia-se no conceito do ser e na incompatibilidade do ser com o não ser; do ente (isto é, de alguma coisa que possui o ser), diz ele que enquanto (= no tempo em que e sob o aspecto em que) é, não pode deixar de ser. — Do exposto se infere que o princípio de contradição enuncia, antes de mais nada, alguma coisa acerca do ente; pertence, pois, em primeiro lugar, à ontologia, e não à lógica. O princípio lógico de contradição fundamenta-se no ontológico. Exprime que duas proposições mutuamente contraditórias não podem ser verdadeiras; que, por conseguinte, nunca se pode afirmar e negar simultaneamente a mesma coisa. A manutenção deste princípio é a condição primeira de todo pensamento ordenado. VIDE oposição. — De Vries. [Brugger]