As qualidades que, segundo Descartes, são requeridas por todo conhecimento para ser válido e indubitável. — A “clareza” é a qualidade que torna urna ideia reconhecível no meio de outras; difere da “distinção”, pela qual uma ideia é intrinsecamente analisável. [Larousse]
(in. Clearness and distinctness; fr. Clarté et distinction; al. Klarheit und Deutlichkeit; it. Chiarezza e distinzionè).
Os dois graus da evidência, no sentido subjetivo em que foi entendida a partir de Descartes. Diz Descartes: “Chamo de clara a percepção presente e manifesta ao espírito de quem lhe presta atenção, assim como dizemos que são claras as coisas que temos diante do olho que as olha”. Chama-se, porém, distinta a percepção que, “sendo clara, é tão desligada e separada de todas as outras que não contém absolutamente em si nada além do que é claro” (Princ. phil, I, 45). Essa distinção cartesiana não é muito precisa, ao menos no que se refere ao conceito de distinção; Locke, que a reproduz, não a torna mais precisa (Ensaio, II, 29, § 4). Mas Leibniz tornou-a mais precisa, ao considerar clara a noção que permite discernir a coisa representada e obscura a que não o permite, como quando nos lembramos de uma flor ou de um animal que vimos, mas não o suficiente para distingui-lo dos outros e para reconhecê-los. A distinção é um grau muito superior de evidência e, além do mais, um grau que pertence especificamente à evidência racional. Com efeito, uma noção é confusa quando não permite que se distingam suas notas constitutivas; p. ex., os odores, os sabores, as cores, embora possam ser claramente reconhecidos, não podem ser descritos e definidos com base em seus traços constitutivos; tanto é verdade que não podemos explicar o que é uma cor a um cego. Ao contrário, as noções distintas são aquelas para cujos traços podemos ter a definição nominal, isto é, a enumeração das suas notas suficientes. Assim, o conhecimento que um químico tem do ouro é distinto. O conhecimento distinto é indefinível só quando vem antes, ou seja, não é derivável dos outros (Op., ed. Erdmann, p. 79). A distinção assim estabelecida por Leibniz é muito importante porque é a própria distinção entre o conhecimento sensível e o conhecimento racional. O conhecimento sensível pode chegar à clareza, mas é sempre confuso; o conhecimento racional é o conhecimento distinto. A filosofia alemã, de Leibniz a Kant, conservou essa distinção e o próprio Kant a aceita embora não a julgue suficiente para estabelecer a diferença entre o conhecimento sensível e o conhecimento racional. Diz ele: “A consciência das próprias representações, quando basta para diferenciar um objeto dos outros, chama-se clareza. Aquela pela qual se esclarece a composição das representações chama-se distinção. Só esta última pode fazer que uma soma de representações se torne um conhecimento no qual seja pensada a ordem da multiplicidade” (Antr., I, § 6).
Essa doutrina da diferença entre clareza e distinção como graus da evidência não conservou a mesma importância na filosofia contemporânea, que retornou ao antigo conceito objetivista da evidência. Todavia Husserl ainda utiliza o conceito de clareza para definir a consciência à qual o objeto é dado “puramente em si mesmo, exatamente como é em si mesmo… No caso da plena obscuridade, polo oposto da plena clareza, nada chegou a ser dado, e a consciência é obscura, não mais vidente nem oferente em sentido próprio” (Ideen, I, § 67). [Abbagnano]