causalidade aristotélica

Não se encontra nem em um nem em outro destes filósofos um tratado completo sobre a causalidade. Suas concepções sobre este assunto são fragmentárias e, a bem dizer, mais implicadas nas diversas démarches do seu pensamento do que desenvolvidas por si mesmas. É entretanto possível, simplificando, reconduzir essas concepções a dois centros principais de interesse: o da causalidade na teoria da ciência e o da causalidade no estudo de Deus (causalidade transcendente). A primeira destas elaborações é toda inteira de Aristóteles, ao passo que a segunda somente encontrou o seu pleno desenvolvimento em Tomás de Aquino.

É, de início, nos Segundos Analíticos e na Física (II) que se encontra nossa noção. Basta aqui relembrar as conclusões precedentemente adquiridas: há duas principais.

A ciência é o conhecimento pelas causas. É a própria definição da ciência, dada por Aristóteles nos Segundos Analíticos e que ele retomou notadamente no segundo livro da Física e no primeiro livro da Metafísica:

Scientia est cognitio per causas.

“Sabemos” uma coisa na medida em que conhecemos a causa; a causa é o princípio próprio da explicação científica.

Todavia, não nos deixemos confundir; se, como já observamos, Aristóteles e Tomás de Aquino parecem apresentar, de início, a causa em um contexto racional de explicação ou sob uma função lógica, isso não quer dizer que para eles esta noção não tenha valor de realidade. Efetivamente, se a causa dá resposta aos “porquês”, se ela explica, é porque ela é em primeiro lugar princípio de realidade. Deve-se mesmo dizer que fundamentalmente é isto o que ela é. E cabe a Tomás de Aquino, em várias oportunidades, sublinhar fortemente este realismo, afirmando que a causa se refere diretamente ao esse, sobre a existência, isto é, sobre o que em si há de mais concreto: hoc nomen vero causae importat in fluxum quemdam ad esse causati (Metaf., V, I, 1).

A explicação causal nas ciências pode se efetuar segundo quatro linhas de causalidade. É a tese clássica por excelência do aristotelismo. Há, na ordem da explicação física, quatro espécies de causas a considerar: a causa material, a causa formal, a causa eficiente e a causa final. Mas se, na ciência física, demonstra-se pelas quatro causas, em matemática deve-se considerar tão somente a causa eficiente, ao passo que em metafísica referimo-nos sobretudo às causas formal, eficiente e final.

Em conclusão, no plano que permanece sempre primeiro do ser objetivo, a causa é o que dá efetivamente o ser e isto segundo as diversas linhas de causalidade – ao passo que no plano derivado da explicação, a causa é o que dá razão de cada ser e aqui ainda segundo as mesmas quatro linhas possíveis de explicação causal. Uma causa é pois essencialmente: aquilo de que uma coisa depende segundo seu ser ou seu devir

Causae autem dicuntur ex quibus res dependet secundum esse suum vel fieri.
Fís., I, 1, 1

Desta definição observar-se-á que a causalidade implica necessariamente estes três elementos: distinção real da causa e do efeito; dependência efetiva no ser; consequentemente anterioridade da causa sobre o efeito. [Gardeil]