ciências do espírito

As ciências do espírito contrapõem-se, principalmente desde Dilthey, às ciências da natureza (ciência natural); ambas em conjunto formam o domínio total das ciências da experiência, Como o seu nome indica, diferenciam-se consoante os domínios de realidade pesquisados, bem como segundo os modos de os considerar ou métodos nelas implicados.

A ciência natural prescinde da peculiaridade individual e ocupa-se com o universal, isto é, com as enunciações e leis aplicáveis de modo igualmente válido a muitos indivíduos e processos particulares. Seu modo de proceder baseia-se em que a coisa natural singular não possui qualquer marca peculiar individual, mas representa unicamente sua espécie em constante repetição do mesmo. Sendo reiterável e substituível à discrição, é objeto de investigação só enquanto sujeito de sua espécie (não enquanto este indivíduo). Como os indivíduos se parecem exatamente, a série deles não constitui propriamente um devir histórico, mas apenas uma simples reiteração indiferenciada e a-histórica na coexistência e sucessão espacial e temporal. Por detrás encontra-se a necessidade natural que tudo fixa, de modo unívoco e invariável, segundo a lei que diz: causas iguais produzem sempre efeitos iguais; por isso a ciência natural tem em mira a explicação causal (explicar).

No pólo oposto, delineia-se a ciência do espírito em sua essência. Ocupa-se dos vários aspectos da vida espiritual e de suas objetivações; pelo que, apresenta-se, p. ex., como ciência da linguagem, da arte ou da religião. Fala-se também de ciências da cultura ou ciências culturais, porque o homem com sua atividade criadora espiritual vai necessariamente aperfeiçoando o que é dado na natureza; seu ato criativo é já em si cultura e produz bens objetivos culturais. Por tal forma se rompe o quadro do naturalmente necessário, obtendo-se um verdadeiro devir histórico; a vida do espírito, a atividade espiritual criadora da cultura desenvolve-se numa forma essencialmente histórica. Assim as ciências do espírito movem-se no âmbito da história, podendo afirmar-se que se empenham na tarefa de compreender a história bem como o que nesta se tem realizado. A história não trata da guerra ou do general em geral, mas, p. ex., da guerra gaulesa e do general César. A reflexão aplica-se, portanto, imediatamente ao concreto, ao singular, considerando-o justamente em sua peculiaridade única, irrepetível. Encontra-se já aqui o princípio seletivo, segundo o qual a atenção fixa-se naqueles homens, grupos, acontecimentos e feituras, que realmente representam algo de novo, de irrepetível, que contribuem de maneira essencial para o desenvolvimento da humanidade global e que, desse modo, exercem profunda influência sobre os contemporâneos e a posteridade. Tal seleção é possível, porque neste caso os indivíduos, a despeito de sua natureza humana comum, não são inteiramente iguais uns aos outros, senão que, mercê da força criadora e da liberdade do espírito, são capazes de elaborar e de imprimir um cunho próprio. Como este não se fixa de modo unívoco e causal, não basta, neste domínio, a explicação pelas causas, mas surge como único método adequado a compreensão (compreender).

A diferença entre ciências do espírito e ciências da natureza é poderoso testemunho em abono da peculiaridade do espírito em frente de tudo o que pertence à ordem natural. Todavia a orientação para o individual e concreto conduzia já em Dilthey, e também noutros autores posteriores, a um certo relativismo. — Lotz.