feitiço

A palavra portuguesa feitiço (a partir da qual foi cunhado o termo fetiche) não deriva diretamente, como acreditava De Brosses, da raiz latina fatum, fari, fanum (no sentido, portanto, de coisa fadada, encantada), mas do latim facticius, “artificial”, da mesma raiz de facere (Santo Agostinho fala até, a propósito dos ídolos pagãos, de um genius facticiorum deorum, onde o termo facticius antecipa, sem dúvida, o significado moderno). Contudo, a raiz indoeuropeia *dhê-, de facere, está realmente ligada à de fas, fanum, feria, e tem originalmente um valor religioso que ainda transparece no sentido arcaico de facere, “fazer um sacrifício” (cf. A. ERNOUT; A. MEILLET. Dictionnaire étymologique de la langue latine, s. v. “facio” e “feriae”). Neste sentido, tudo o que é factício pertence por direito à esfera religiosa, e o espanto de De Brosses diante dos fetiches não só não tem razão de existir, mas inclusive revela o esquecimento do estatuto originário dos objetos. [AgambenE:65]