filosofia e experiência

Em um grau inteiramente inferior do conhecimento, observa Aristóteles (Metaf., A. C. I, 980 a 19), encontramos a sensação, tipo de conhecimento que temos em comum com os animais. Estes já têm uma perfeição mais ou menos grande segundo a sensação se acompanhe ou não de memória. Da memória, com efeito, nasce, por acumulação de lembranças, a experiência.

Com o homem, nós nos elevamos mais alto, até ao nível da arte e do raciocínio. A arte aparece quando, de uma multidão de noções experimentais, se desprende um único julgamento universal aplicável a todos os casos semelhantes. Com efeito, formar o julgamento de que tal remédio aliviou Cállias, atingido por tal doença, depois Sócrates, depois vários outros individualmente considerados, é o fato da experiência. Porém declarar que tal remédio aliviou a todos os indivíduos atingidos pela mesma doença, isto já pertence à arte. Com a arte nós estamos no plano do conhecimento verdadeiramente racional, que se distingue do grau inferior do saber, nisso que o homem não se contenta mais em constatar simplesmente a existência dos fatos, mas procura-lhe também a razão explicativa ou a causa. A ciência, que se encontra no mesmo nível, acrescenta à arte o caráter de conhecimento desinteressado. O sábio busca o saber pelo saber, e sem se preocupar diretamente com sua utilidade ou aceitação.

Destas considerações resulta que a filosofia, que é eminentemente ciência, é um conhecimento pelas causas: “Philosophia est cognitio per causas”.

Na mesma ordem de ideias procurou-se, hoje, precisar as relações da filosofia com o senso comum, que é também uma forma não cientificamente elaborada de conhecimento. Basta reproduzir aqui a conclusão do estudo que Maritain consagrou a esse assunto (Élements de Philosophie thomiste, 1. Introduction générale à la philosophie, pp. 87-94) : “A filosofia não é fundamentada sobre a autoridade do senso comum tomado como consenso geral ou como instinto comum da humanidade, ela deriva todavia do senso comum se se considera nele a inteligência dos princípios imediatamente evidentes. Ela é superior ao senso comum como o estado perfeito ou “científico” de um conhecimento verdadeiro é superior ao estado imperfeito ou “vulgar” deste mesmo conhecimento. Todavia, a filosofia pode ser, por acidente, julgada pelo senso comum”.

Exprimindo-se assim, Maritain entende colocar a filosofia tomista, na qual ele pensa, entre as afirmações simplistas da escola escocesa, e algumas pretensões da crítica moderna. A filosofia não tem de buscar outro fundamento senão ela mesma, sendo ela o estado superior e científico da possessão dos princípios. Todavia, ela está em acordo e em continuidade com o conhecimento vulgar desses mesmos princípios. Disto pode-se concluir, como precedentemente, que a filosofia se distingue das formas comuns do saber pelo seu caráter de ciência ou de conhecimento explicativo. [Gardeil]