(in. Tragic; fr. Tragique; al. Tragisch; it. Tragico).
O conceito de trágico foi, às vezes, discutido pelos filósofos não só em relação à forma de arte que é a tragédia, mas também em relação à vida humana em geral, ou ao palco do mundo. O ponto de partida implícito ou explícito dessas discussões quase sempre é a definição aristotélica de tragédia, segundo a qual ela é “imitação de acontecimentos que provocam piedade e terror e que ocasionam a purificação dessas emoções” (Poet, 6, 1449 b 23). As situações que provocam “piedade e terror” são aquelas em que a vida ou a felicidade de pessoas inocentes é posta em perigo, em que os conflitos não são resolvidos ou são resolvidos de tal modo que determinam “piedade e terror” nos espectadores. W. Haeger escreveu: “na tragédia grega a felicidade, como toda posse, não pode ficar muito tempo com quem a detém; a perpétua instabilidade é inerente à sua natureza. A convicção de Sólon, de que há uma ordem divina no mundo, encontrou nessa noção (embora tão dolorosa para o homem) o apoio mais sólido. Esquilo também é inconcebível sem tal convicção, que pode ser chamada mais de noção que de crença” (Paideia, II, cap. I; trad. it., p. 449). As interpretações da natureza do trágico no pensamento moderno são três. 1) trágico é o conflito continuamente resolvido e superado na ordem perfeita do todo; 2) trágico é o conflito não solucionado e insolúvel; 3) trágico é o conflito que pode ser solucionado, mas cuja solução não é definitiva nem perfeitamente justa ou satisfatória.
1) O primeiro conceito de trágico é de Hegel, para quem o conflito em que consiste o trágico, embora constituindo a substância e a verdadeira realidade, não se conserva como tal, mas encontra justificação só na medida em que é superado como contradição. “No entanto o objetivo e o caráter trágico são legítimos” — diz Hegel — “porque é necessária a solução do conflito em que ele consiste. Por meio dessa solução a eterna justiça se afirma sobre os fins e os indivíduos, de tal modo que a substância moral e a sua unidade se restabelecem com o ocaso das individualidades que perturbam o seu repouso” (Vorlesungen über die Aesthetik, ed. Glockner, III, p. 530). Portanto, a solução trágico restabelece a harmonia, e o que ela destrói é apenas a “particularidade unilateral” que não pôde concertar-se com a harmonia (Ibid., ed. Glockner, III, p. 530). Obviamente, desse ponto de vista, que caracteriza o otimismo ou providencialismo de caráter romântico, a tragédia é simplesmente a aparência de uma comédia substancial: tudo acaba bem, e o que se perde é a “particularidade unilateral” que não tem o mínimo valor.
2) A segunda interpretação do trágico é de Schopenhauer, segundo a qual o trágico é conflito insolúvel. Para ele, “a tragédia é a representação da vida em seu aspecto terrificante. É ela que nos apresenta a dor inominável, a aflição da humanidade, o triunfo da perfídia, o escarnecedor domínio do acaso e a fatal ruína dos justos e dos inocentes; por isso, ela constitui um sinal significativo da natureza do mundo e do ser” (Die Welt, I, § 51). Mas a inevitabilidade e, portanto, a certeza de um destino maléfico ou de uma injustiça imanente, assim como a inevitabilidade e a certeza da justiça e da harmonia, suprimem a tragicidade. Diante deles, de fato, a única atitude possível é a resignação ou o desespero: atitudes que, assim como as que lhe são opostas, excluem o conflito constitutivo do trágico.
3) A terceira concepção foi apresentada por Schiller na obra Über naive und sentimenta-lische Dichtung (1795-96). Nela, otrágico é apresentado como manifestação da poesia sentimental (v. ingenuidade), mais precisamente da poesia que representa o conflito entre o real e o ideal. A poesia sentimental divide-se em sátira e elegia: na sátira o poeta tem por objeto o geral, considerando-o insuficiente em relação ao ideal. Ainda segundo Schiller, quando a insuficiência do real é representada pelo conflito entre o real e nossas exigências morais, tem-se a sátira séria, que é o trágico (Werke, ed. Karpeles, XII, p. 150). Em conceitos semelhantes inspirava-se a chamada “pantragicidade” de Hebel (v. Werke, X, p. 43). Bem mais paradoxalmente, Nietzsche via no trágico, por um lado, o caráter terrificante da existência, por outro a possibilidade de aceitar e transfigurar esse caráter ou por meio da arte ou da vontade de potência. A primeira solução é a que Nietzsche atribui aos gregos em Die Geburt der Tragödie (1872). O homem grego, que tinha condições de distinguir com clareza o horrível e o absurdo da existência, conseguiu transfigurá-la por meio do espírito dionisíaco, domando e sujeitando o horrível, que assim se transforma em sublime (o objeto da tragédia), e libertando da aversão ao absurdo, que assim se transforma em cômico (o objeto da comédia) (Die Geburt der Tragödie, § 7). Mais tarde, Nietzsche achou que a saída do terrificante da vida estaria na aceitação da vida graças à vontade de potência, considerando o trágico como aceitação dionisíaca do que é terrificante e incerto. Escreveu então “A profundidade do artista trágico reside no fato de que seu instinto estético considera as consequências remotas e não se detém com visão estreita nas coisas próximas; de que ele afirma a economia à larga, que justifica o que é terrível, maligno e problemático, mas não se contenta apenas em justificá-lo” (Wille zur Macht, ed. 1901, § 374). Essa concepção do trágico — que costuma ser expressa com imperfeição ou mesclada com as outras duas — pode ser reconhecida pelo fato de abrir espaço, em sua caracterização, à problematicidade da situação trágico, vale dizer, à possibilidade de ela ser decidida de um modo ou de outro, sem que a decisão seja definitiva ou perfeita. Foi com esse espírito que Miguel de Unamuno entendeu a tragicidade em Do sentimento trágico da vida (1913), expressando-a com o quién sabe? de Don Quixote. No mesmo sentido expressaram-se Scheller (Vom Umsturz der Werte, 1953), Jaspers (Über das Tragische, 1952) e Cantoni (Trágico e senso comune, 1964). P. Romanell diz que, ao contrário da épica, em que o conflito se dá entre o bem e o mal, no trágico o conflito se dá entre bens diferentes, valores heterogêneos entre os quais a escolha é dolorosa e sempre implica sacrifício (Making of the Mexican Mind, 1952, p. 22). Esse caráter do trágico é bem realizado na tragédia grega. A tragédia de Sófocles baseia-se na convicção de que existe uma ordem divina no mundo, em virtude da qual às vezes o inocente precisa pagar por um erro cometido por outros. O fato de a solução do conflito não poder ser límpida, de algo se perder nessa solução e de esse algo não ser — como dizia Hegel — uma “particularidade unilateral” é o que constitui o fascínio e a verdade da tragédia. [Abbagnano]