Florença

De importância relativamente secundária no início da Idade Média, apesar de seu papel como sede de um ducado lombardo e, mais tarde, como residência ocasional do margrave da Toscana, Florença ascendeu a um lugar de destaque na Toscana e a uma posição proeminente na economia europeia depois do século XII. Sua grande riqueza, derivada principalmente da indústria (em especial a têxtil), combinada com o comércio e a atividade bancária, encorajou a imigração, o que resultou no rápido crescimento de sua população mas também contribuiu para as divisões internas.

Desde os começos do século XIII, a nobreza e os grandes mercadores, secundados por grupos sociais inferiores, estavam divididos em dois partidos: os gibelinos, que apoiavam a causa imperial na luta entre o Império e o Papado desde 1230, aproximadamente, e os guelfos, que eram favoráveis à causa papal, embora os interesses e lealdades de ambos os partidos fossem predominantemente locais. O conflito civil exigiu novos dispositivos para manter a ordem e, no final do século XII, o governo consular que administrara a comuna independente de Florença desde pouco depois da morte de Matilde da Toscana (1115), foi substituído pelo cargo de podestà para o exercício da magistratura suprema. A fim de assegurar uma administração imparcial, o podestà foi recrutado, a partir do começo do século XIII, fora da cidade.

No transcurso do século XIII, o poder político passou a repousar cada vez mais nos mercadores organizados nas maiores guildas, graças ao sucesso internacional do comércio e dos bancos florentinos, o que foi confirmado pela emissão, desde 1252, do florim de ouro. Dois anos antes, a população não-nobre tinha estabelecido sua própria organização — uma espécie de Estado dentro do Estado — duplicando as instituições comunais em suas próprias magistraturas e conselhos. Isso durou até a vitória gibelina sobre a Florença guelfa em 1260, e foi restabelecido numa base corporativista, agora de forma permanente, em 1282. Em 1293, a vitória do novo regime do popolo culminou na exclusão das famílias nobres do governo, definidas como magnatas, e sua sujeição a severas punições por delitos contra os popolani. Os seis, depois oito, priores e o gonfaloneiro de justiça foram mantidos até o século XVI no governo da cidade, ficando o podestà reduzido às suas funções judiciais. A construção, iniciada no final do século, da nova catedral e do Palazzo Vecchio, indica a prosperidade de Florença e o orgulho dos cidadãos por suas realizações; também reflete o espetacular crescimento populacional, que por volta de 1338 tinha provavelmente superado a marca dos 100.000 habitantes.

O regime popular adotou o guelfismo como sua bandeira mas a divisão do partido guelfo, na virada do século, prenunciou o surgimento de facções de que Florença continuou sofrendo durante todo o século XIV, e que foi intensificado depois da Peste Negra. Outras fontes de conflito interno foram o antagonismo, aguçado pelas Ordenações de Justiça de 1293, entre a nobreza magnata e setores do popolo, e, cada vez mais, os contrastes sociais entre os artesãos das guildas menores e os patrícios das guildas maiores. Após o efêmero governo despótico (1342-43) de Gautier de Brienne, duque de Atenas, os “novos homens” organizados nas guildas de ofícios conseguiram aumentar substancialmente sua participação no governo; mas à recuperação patrícia seguiu-se uma tentativa da liderança oligárquica do partido guelfo, com vistas ao estabelecimento do controle virtual do Estado. Na esteira da reação contra essa política, o descontentamento entre os trabalhadores submetidos às guildas da lã e da seda explodiu em 1378 na revolta dos Ciompi. A Peste Negra de 1348 tinha reduzido dramaticamente, talvez em mais da metade, a população de Florença, mas os efeitos econômicos só estavam indiretamente relacionados com essa convulsão social. O regime democrático de guildas instalado após sua supressão foi a última e a mais radical manifestação de organização corporativa no governo da cidade.

O regime que o substituiu em 1382 já não era dominado pelas guildas ou o partido guelfo. Instituições e valores corporativos continuaram sendo elementos importantes na política florentina mas deixaram de ter a influência de que desfrutavam anteriormente. O novo regime era aristocrático, na medida em que o patriciado ocupava uma posição predominante dentro de uma classe governante definida pela elegibilidade para altos cargos; mas as guildas de ofícios não estavam inteiramente excluídas do regime. A autoridade do governo foi reafirmada, embora as decisões mais importantes continuassem sujeitas ao consentimento dos conselhos legislativos. Uma das notáveis realizações do regime foi a expansão dos domínios florentinos pela aquisição de Arezzo, Pisa e Cortona com seus territórios, e a gradual transformação dos mesmos num Estado territorial. A oposição toscana ao expansionismo florentino ajudou o duque de Milão, Giangaleazzo Visconti, em sua investida rumo a essa região. Em suas guerras contra ele, desde 1390, os florentinos autoproclamaram-se defensores da liberdade contra a tirania; a morte de Giangaleazzo em 1402 e a conquista de Pisa em 1406 garantiram não só a independência da cidade mas também sua hegemonia na Toscana.

O regime aristocrático gozou de um notável grau de coesão até a década de 1420, quando, diante de uma crise fiscal e de renovada guerra com Milão, a cidade dividiu-se uma vez mais em duas facções. Tanto a implantação em 1427 de um imposto progressivo baseado na propriedade, o catasto, quanto a paz com Mião em 1428 não atenuaram essa divisão, que culminaria em 1433 com a vitória dos Albizzi sobre os Medici, e no exílio de Cosimo de Medici. O regresso deste em 1434 assinalou a derrota dos Albizzi, seguido por seu exílio e o de muitos de seus adeptos. Através de reformas, especialmente no método de eleger a Signoria, Cosimo estabeleceu gradualmente sua ascendência pessoal e a do seu partido, até obter o controle da administração e da legislação. Mas essas reformas defrontaram-se com repetida resistência e sofreram seu mais sério revés em 1456-66. Embora efêmero, o êxito dessa oposição aos controles medicianos demonstrou a robustez das tradições republicanas.

Em 1478, a hostilidade dos Pazzi, apoiados por Roma, ocasionou um atentado contra a vida de Lourenço de Medici, do qual ele saiu ileso mas em que seu irmão Giuliano morreu apunhalado. A conspiração dos Pazzi resultou em guerra contra o papa e o rei de Nápoles; na conclusão da paz, a posição de Lourenço como chefe virtual da república estava decisivamente estabilizada e fortalecida, mas o papel da elite política do regime também foi promovido pela criação de um Conselho Supremo dos Setenta, a quem incumbia controlar a legislação, assim como a política externa e interna; estabelecido para mandatos de cinco anos, o Conselho foi periodicamente renovado até a queda do regime. Após a morte de Lourenço em 1492, Pedro não conseguiu preservar o delicado equilíbrio entre interesses divergentes que seu pai tinha realizado em Florença e do qual fizera a pedra angular de sua política externa. Impotente para impedir a invasão da Toscana por Carlos VIII, Pedro fugiu da cidade em meio a um levante popular (1494). Todas as instituições medicianas foram abolidas mas os patrícios, que tinham desempenhado um papel decisivo na queda do regime Medici, e que haviam pertencido ao seu mais prestigioso grupo, não conseguiram restaurar o regime aristocrático do início do século XV. A criação, devida em grande parte à pregação de Savonarola, de um Grande Conselho de mais de 3.000 cidadãos que — imitando o maggior consiglio veneziano — eram exclusivamente responsáveis pela legislação e as eleições para cargos oficiais, significou uma radical reforma constitucional que, embora ampliando substancialmente a participação ativa dos cidadãos na política, tornou possível para uma elite política manter um papel predominante no governo de Florença. Mesmo assim, o descontentamento patrício com as crescentes tendências democráticas no Grande Conselho levou em 1502 à transformação do gonfaloneirato de justiça num cargo vitalício. Não obstante, não foi a oposição interna mas a pressão militar resultante da batalha de Ravena que constituiu a principal causa da queda do regime republicano e do restabelecimento dos Medici em 1512. (DIM)