Não se pode falar de uma gnosiologia, no sentido de uma disciplina filosófica independente, nem na Antiguidade nem na Idade Média. Na filosofia antiga encontramos numerosas reflexões gnosiológicas, especialmente em Platão e Aristóteles. Mas as investigações gnosiológicas estão ainda englobadas nos textos metafísicos e psicológicos. Como disciplina autônoma a gnosiologia aparece pela primeira na Idade Moderna, sendo considerado seu fundador o filósofo inglês John Locke, em cuja obra fundamental — Ensaio sobre o entendimento humano, 1690 — trata de forma sistemática as questões da origem, essência e certeza do conhecimento humano. Leibniz, em seus Novos ensaios sobre o entendimento humano — editados postumamente em 1765 — tentou uma refutação do ponto de vista gnosiológico defendido por Locke. Sobre os resultados por este obtidos edificaram novas construções, na Inglaterra, George Berkeley no seu Tratado dos princípios do conhecimento humano (1710) e David Hume em sua obra fundamental — Tratado da natureza humana, 1739-40 — e no resumo desse tratado — Investigação sabre o entendimento humano, 1748.
Como verdadeiro fundador da gnosiologia dentro da filosofia continental europeia apresenta-se Immanuel Kant. Na sua obra gnosiológica capital, a Critica da razão pura (1781), procura, essencialmente, dar uma fundamentação crítica do conhecimento científico da natureza. Ele próprio chama ao método de que se serve nela “método transcendental”. Este método não investiga a origem psicológica mas sim a validade lógica do conhecimento. Não pergunta — como o método psicológico — de que maneira surge o conhecimento, mas sim como é possível o conhecimento, sobre que bases, sobre que pressupostos supremos ele assenta. Em Fichte, sucessor imediato de Kant, a gnosiologia aparece pela primeira vez com o título de “teoria da ciência”. Mas já nele se manifesta essa confusão entre a gnosiologia e a metafísica, que se acentua francamente em Schelling e Hegel e que também se encontra de forma evidente em Schopenhauer e Von Hartmann.
Em oposição a esta forma metafísica de tratar a gnosiologia, o neokantismo — que surgiu na altura de 1870 — esforçou-se por traçar uma nítida separação entre os problemas gnosiológicos e metafísicos. Todavia, tanto procurou colocar os problemas gnosiológicos em primeiro lugar que a filosofia correu o risco de reduzir-se à gnosiologia. Além disso, o neokantismo desenvolveu a teoria kantiana do conhecimento numa direção bem determinada. O exclusivismo por ele provocado depressa fez surgir várias correntes gnosiológicas contrárias. É assim que hoje nos encontramos perante uma infinidade de direções gnosiológicas.
Portanto, o fenômeno do conhecimento, enquanto objeto de uma disciplina filosófica, só na época moderna tornou-se autônomo, não obstante ter sido a reflexão sobre o conhecer, desde os primórdios da filosofia, um dos primeiros e mais graves problemas. O primado da questão ontológica sobre a gnosiológica no pensamento antigo e medieval não impediu, com efeito, que, com escassas exceções, se tenham esgotados na Grécia todas as posições possíveis no problema do conhecimento. Contudo, somente na época moderna e em particular somente a partir de Kant atingiu a gnosiologia, em virtude da inversão do anterior primado, a maior importância dentro da área filosófica. O descobrimento, por Kant, do plano transcendental, já preparado desde a crítica renascentista e revezado por uma linha que compreende todos os grandes pensadores dos séculos XVI e XVII é, efetivamente, o que outorgou à esfera gnosiológica sua independência com relação às freqüentes invasões da crítica psicológica, das implicações lógicas ou das especulações metafísicas. Por isso se fala propriamente de gnosiologia só a partir de Kant, com o que não se nega a existência anterior do problema, mas unicamente sua autonomia e hierarquia dentro do sistema de saberes filosóficos. [LWVita]