“Modo de produção” é o termo que traduz o alemão Produktionsweise, de uso mais ou menos frequente n’O Capital. Conforme o seu emprego por Marx, Produktionsweise parece ser uma categoria mais ampla que Produktionsprozess, “processo de produção”. Uma vasta nota ao pé da página n’0 Capital permite-nos compreender a distinção entre as duas categorias, embora fique nebuloso o status epistemológico do que seja o “modo de produção”. Nesta nota, o “processo de produção” está muito nitidamente incluído no “modo de produção”; o ponto de vista exposto por Marx é que “o determinado modo de produção e as relações de produção que a ele correspondem, isto é, a estrutura econômica da sociedade, [constituem] a base real a partir de onde uma superestrutura jurídica e política se constrói, e a este modo de produção também vão corresponder formas precisas da consciência social, isto é, o modo de produção da vida material determina os processos sociais, políticos e espirituais”. Respondendo à objeção de que isso seria verdadeiro para uma sociedade dominada pelo ‘materialismo’, mas não para uma época cristã como a Idade Média, onde a religião é um “forte determinante”, Marx mostra a largueza do seu conceito de modo de produção. Ele é “a maneira pela qual” os homens de certo tempo “ganham a sua vida”, e esta sua maneira de ‘ganhar a vida’ condicionará o domínio (aparente) de uma religião ou um ideário sobre a época. Como Marx nunca se preocupou em esclarecer o status dos conceitos extra-econômicos que empregava, ficamos, para compreender o que seja o modo de produção, dependentes do esclarecimento de termos mais ou menos vagos como “vida material”, “ganhar a vida”, e análogos.
Esta dificuldade pode ser vencida de duas maneiras. A primeira, que é o caminho seguido por pensadores como Lukács, vai relacionar o conceito de modo de produção ao conceito de praxis, exposto por Marx nas Teses sobre Feuerbach. Esta posição, que desenvolvemos em outro lugar teria eventual relevância numa teoria da comunicação formando uma ponte entre Marx e a fenomenologia. A existência social é eminentemente prática porque não é possível construir-se uma teoria da sociedade a partir da noção de indivíduo, considerando-se a sociedade como um agregado de indivíduos. Ao contrário; o homem sempre existe em relação com outros homens (mesmo que esta relação seja uma recusa, como é o caso extremo do eremita; v. solipsismo ). As maneiras “institucionalizadas” de relacionamento numa sociedade são as relações de produção, e a direção, o significado, o sentido básico, o objeto que se persegue com estas relações de produção é aquilo que caracteriza o modo de produção. Este, portanto, é uma “Art und Weise”, a forma, a maneira especial pela qual “a vida é ganha’” em sociedade. Haveria, dentro deste ponto de vista, quase uma intencionalidade fenomenológica na categoria marxista de “modo de produção”. A segunda forma de se compreender o que seja um modo de produção para Marx foi desenvolvida por Louis Althusser. A análise de Althusser, que é extremamente rica, vê os diferentes modos de produção como as diferentes maneiras pelas quais se estruturam as relações de produção; haveriam, para Althusser, maneiras fundamentais de se realizar esta estruturação, e as diferentes sociedades poderiam se constituir por modos “mistos”, combinações dos dos diferentes modos de produção fundamentais. Na análise de Althusser dá-se uma grande ênfase ao aspecto estrutural do conceito de modo de produção, e embora Althusser veja neste aspecto do problema uma garantia para a sua cientificidade , em oposição ao approach ‘ideológico ‘ de uma fenomenologia do modo de produção, parece-nos que as duas posições não são necessariamente irreconciliáveis. (Francisco Doria – DCC)