semelhança e diferença

Se a realidade do mundo que nos cerca fosse uniforme e homogênea; se tudo nos parecesse igual, sem qualquer nota de distinção, de diferenciação, não poderíamos nunca chegar a conhecer os fatos, por que o acontecer seria apenas um grande fato. Mas sucede que a realidade aparece-nos heterogeneamente diversa, diferente e diversificada. Se a cor dos fatos (corpóreos) fôsse a mesma, impossível seria chegar a compreender que há cores, do dar um nome a uma cor que percebemos distinta de outra. Certas partes da realidade visível dão aos olhos uma impressão de outro gênero do outras partes da realidade. Por isso, percebemos cores diferentes. Eis aqui, porque podemos comparar um objeto de uma cor com a de outro objeto, e verificar se se parecem, e perceber também se há diferenças, pois nunca poderíamos chegar a perceber que alguma coisa se parece, na cor por exemplo, a outra coisa, se não existissem objetos de cores que se desassemelham, que diferem. Logo a compreensão do semelhante, do parecido, é contemporânea da do diferente, pois também não podemos compreender o diferente, o diverso, se não nos for possível, contemporaneamente, comparar com o semelhante, o parecido.

Uma pergunta é possível aqui: é a semelhança anterior à diferença?

Para alguns filósofos, a percepção do semelhante é anterior, no homem e nos animais, à percepção das diferentes, como por exemplo o afirmam Maine de Birau (1766-1824, filósofo francês), e Bergson.

Nossa sensação é acompanhada de memória, e uma sensação evoca outra, passada, que se lhe assemelha. A comparação é uma associação. Hume (David, filósofo inglês) salienta que as associações por semelhança são mais importantes e numerosas que as outras, além de serem mais fáceis e mais de acordo com a nossa natural preguiça mental. A criança, por exemplo, apreende em primeiro lugar as semelhanças.

É desta forma mais primitivo o sentimento das semelhanças do que o das diferenças. Não há comparação onde nãosemelhança. (O verbo comparar vem do latino comparare, formado do adjetivo par, quer dizer parelho, igual, semelhante, significando, portanto, pôr um ao lado do outro; tornar semelhante). Além disso para comparar não precisamos do diferente, o qual é dispensável, pois só podemos comparar duas partes da realidade que são semelhantes, não permitindo nunca que comparemos partes da realidade absolutamente diferentes.

Por muito sólidos que nos pareçam tais argumentos, acima alinhados, permanecemos, contudo, firmes na posição da contemporaneidade. [MFS]